20/08/2018

Ao fim de
(quase) 40 anos
(quase) duas semanas sem fumar
muitos meses de coração mais seco que um tronco deitado no deserto
alguns banhos de mimo vindos das gerações serpianas mais novas
(não parece, mas está tudo interligado)

peguei no sapato e de lá retirei aquela pedra pontiaguda que me andava a incomodar há demasiado tempo, a saber: achava que só conseguia criar, i.e., fazer coisas com as mãos, por impulso amoroso. Trocado por miúdo(a)s, só conseguia criar com o objectivo, meio-galaró e não assumido, de impressionar alguém.
Em conversa ontem com a Catarina (que é das pessoas mais sábias que conheço), ela dizia-me que isso não é forçosamente mau — mas discordo: parece-me uma razão muito comezinha para fazer o quer que seja. Ou para ser a única razão por detrás de um gesto.

Ao fim de …, portanto, percebo que não, há aqui algo mais, uma espécie de auto-suficiência e de prazer no gesto criativo, no gesto rabiscador, que é independente dos sentimentos.
Há, também, algum prazer em fazê-lo desavergonhadamente e humildemente (i.e., sabendo que tenho tanto ainda para aprender), sem ter medo de o mostrar, seja a amigos ou a desconhecidos.

Alegra-me, por fim, saber que — apesar dessa conclusão — se mantém intacta a imaginação de gestos secretos, do pensar com mãos e tintas e barro.

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